segunda-feira, março 17, 2008

Trânsito zen

Em dia de trânsito recorde, monge budista dá dicas de como controlar o estresse

Em seu Uno ano 2002, ele enfrentou o trânsito de São Paulo num desaconselhável início de noite de sexta-feira. Levou buzinada e luz alta para sair da frente, assustou-se com um motoqueiro fazendo ultrapassagem em virada de esquina, enfrentou a obstinação de um caminhoneiro que não permitiu a troca de faixa e, naturalmente, viu-se encurralado num engarrafamento daqueles. Mas nem sequer se abalou.

"Se você tem que enfrentar o trânsito, que enfrente com sabedoria", diz o monge João Koun, 38. Ele é pregador da escola zen do budismo, que se concentra na meditação.

Na semana em que São Paulo bateu recorde de congestionamento -221 km na quinta-feira-, a Folha pegou carona com o monge para saber como se evita o estresse no trânsito paulistano.

Velocidade mínima
O passeio começou na Lapa (zona oeste), onde ele mora, passou pelas avenidas Doutor Arnaldo e Pacaembu e incluiu a marginal Tietê. O Uno precisou de uma hora e meia para percorrer um trajeto de 30 km -a uma velocidade média de apenas 20 km/h.

Cabeça raspada e roupa preta de monge, Koun conversou todo o tempo com a voz tranqüila. Jurou que não passou pela cabeça buzinar para o motorista que jogou o carro em sua frente com violência, sem dar a seta.

"No trânsito, olhamos só a máquina. Mas há uma pessoa ali dentro." O essencial, segundo o monge, está em algo insuspeito e bem concreto: a respiração. O motorista deve prestar atenção ao ar entrando nos pulmões e saindo. Para se concentrar na respiração, uma dica do monge é contar cada inspiração e expiração, de um a dez. O banco do carro deve ficar totalmente na vertical, para facilitar a entrada e a saída do ar.

Terminado o passeio, o monge Koun guardou seu Uno na garagem e revelou: "Se não fosse para a reportagem, eu jamais teria saído de carro a esta hora". Só sai de carro em casos excepcionais. Para chegar ao templo budista, na Liberdade (região central), vai de bicicleta. "Uma forma de não sentir raiva no trânsito é evitá-lo."

Ricardo Westin
Da reportagem local
Folha de São Paulo - 17/03/2008

domingo, março 09, 2008

Libertação dos gakis


No universo simbólico budista há a presença de dez estágios de entendimento. Tratemos, no entanto, dos “seis mundos inferiores” formados pelas vias de expiação, apego e ausência de luz nas seguintes categorias: inferno, animais, gaki, shura, homens e devas. O homem também está num estágio de apego não apenas à matéria, mas igualmente às idéias. As idéias dizem respeito ao espírito. Acima dos homens estão os devas, ainda apegados, mas possuidores de qualidades que os tornam melhores que os humanos. Entretanto, sofrem por causa da vaidade e falta de compaixão.

No entanto são os que se encontram abaixo da condição humana, os que mais sofrem. Um shura é um guerreiro incansável, extremamente apegado às suas convicções, metas e realizações. Pode ser visto como um ser humano, com diferença de se manter acorrentado às paixões de sua própria auto-realização, sem medir conseqüência de seus atos. Sofre em demasia diante das derrotas, pois visa apenas a vitória.

Abaixo deste estão os gakis. É representando como alguém de debilidade física, troncudo, meio corcunda, feio, faminto e com sede. Perambulam de um lado para outro, como fantasmas, pedindo alimento e água. Ainda que consigam alimento e água, o que os tornam barrigudos, não conseguem saciar fome e sede.

Estas categorias podem se referir ao próprio homem, em estados emocionais de queda, desde os apegos de ordem espiritual às de total dependência orgânica. No caso, o gaki somente se realiza, ainda que momentaneamente, comendo e bebendo. Claro que ele é extremamente apegado, beirando às condições sub-humanas de sobrevivência. Por isso, a salvação de um gaki estaria na mudança da sua mentalidade, mas enquanto isso não acontece precisa sanar suas necessidades imediatas. Dar de comer e beber a um gaki é um ato de compaixão, portanto totalmente isento de recompensa.


Um gaki consegue alimentar-se somente pela mão alheia, pois com as próprias mãos não obtém resultado. Por causa de seu aspecto horripilante, ninguém se aproxima dele. Ao contrário, foge. Ou ainda, não se importa com o sofrimento alheio.

Justamente no mundo em que vivemos, as condições apresentadas facilitam o aparecimento de gakis. Podemos dizer de outra forma: da miséria. E a miséria é a própria contradição da existência do acúmulo da riqueza. O gaki é uma representação sobrenatural de algo muito próximo de nossas vidas.

Alimentando os gakis


Durante a realização da Cerimônia de Equinócio costuma-se montar uma mesa com fartura na entrada do templo. Ocasião em que acontece o Sejiki - doação de alimentos. Canta-se na ocasião o Portal da Ambrosia (Kanromon), em que o monge oficiante liberta e chama os gakis para o banquete, abre em seguida as suas bocas e depois deposita um pouco de alimento. Feliz, os gakis reconhecem o ato de compaixão e, em retribuição, dançam demonstrando alegria e, em seguida, retornam ao seu mundo.

Desta vez, a representação dos gakis, durante o canto do Portal da Ambrosia aconteceu na Cerimônia de Equinócio de Outono (Aki Higan), dia 9 de março, domingo, no Templo Busshinji. Oportunidade única, pois serviu de transmissão pedagógica do que realmente dizia o Portal da Ambrosia: doação de alimentos.

Costuma-se nesta ocasião, no Equinócio, ir ao encontro dos antepassados ao atravessar “a outra margem”. Os alimentos são oferendas aos nossos antepassados, mas também a todos os outros que necessitam, entre eles os marginalizados e desprezados gakis. Seres tristes, corroídos pelo sofrimento, são devidamente alimentados pela ação boa dos homens de bem.


Uma cerimônia é um ato simbólico que representa as nossas profundas intenções no plano real. O contrário disto vira apenas espetáculo. Por isso, ao participar de uma cerimônia é assumir compromissos. Em referência, ajudar a todos sem distinção.

quarta-feira, março 05, 2008

Batizado

do filho nasce o pai
tudo é testamento

(Tomás recebe as Três Jóias de Saikawa Roshi. Seu nome do Dharma é Homan: pleno do Dharma)

Pureza

"O Patriarca (um dia) endereçou-se à assembléia como segue:
Em nosso sistema de meditação, nós nem enfatizamos a mente (em contraposição à Essência da Mente) nem a pureza. Tampouco aprovamos a Não-atividade. Quanto a enfatizar a mente, devemos saber que ela é principalmente delusiva; e quando percebemos que ela é apenas um fantasma, não haverá nenhuma necessidade de enfatizá-la. Quanto a enfatizar a pureza, nossa natureza já é intrinsecamente pura; e uma vez que nos libertamos de toda ‘idéia’ delusiva, nada mais haverá além da pureza em nossa natureza, porque é a idéia delusiva que obscurece o Tathata (Aquilo que é). Se direcionarmos nossa mente para enfatizar a pureza, estaremos criando apenas outra ilusão, a ilusão da pureza. Considerando que a ilusão não tem nenhum lugar permanente, é delusivo procurar enfatizá-la. A Pureza não tem forma nem aspecto; mas algumas pessoas vão tão longe que inventam uma ‘Forma da Pureza’, e lidam com isto como um problema o qual devemos procurar uma solução. Sustentando tal opinião, estas pessoas tentam dominar a pureza, e sua Essência da Mente é assim obscurecida."

Sutra da Plataforma, Hui-Neng

Fonte: site Shunya

segunda-feira, março 03, 2008

Da perfeição da vida

Por que prender a vida em conceitos e normas?
O Belo e o Feio... O Bom e o Mau... Dor e Prazer...
Tudo, afinal, são formas
E não degraus do Ser!

(Mário Quintana)