sábado, janeiro 13, 2007

Zanmai Ozammai

O Rei de todos os Samadhis
(Dogen Zenji)

Sentar-se na postura de lótus é transcender o mundo inteiro; é o incomparavelmente precioso e sublime estado dos Budas e Patriarcas. Quando nos sentamos nessa postura, deixamos para trás os descrentes e os demônios e entramos nas profundezas do coração dos Budas e dos Patriarcas. É somente por meio deste Caminho que podemos atingir a transcendência absoluta e alcançar nosso destino final. É por isso que os Budas e Patriarcas se concentraram nesta prática, e em nada mais.

Saiba que o mundo do zazen é completamente diferente de qualquer outra dimensão. Quando esse princípio estiver esclarecido, você deve desenvolver o propósito de atingir a iluminação e buscar a prática verdadeira, a iluminação, e o nirvana.

Quando estiver em zazen, observe se o tempo permeia ou não o espaço vertical e horizontal e reflita sobre a natureza do zazen: ela é diferente da atividade normal? É um estado altamente vigoroso? É pensar ou não-pensar? Ação ou não-ação? O zazen é apenas a postura de lótus ou ele existe no corpo e na mente? Ou ele transcende o corpo e a mente? Devemos examinar esses diferentes pontos de vista. O objetivo é obter a postura de lótus em seu corpo e a postura de lótus em sua mente; e é preciso que você mantenha a postura de lótus quando o corpo e a mente forem abandonados.
Meu mestre Nyojo dizia: “Quando você pratica zazen o corpo e a mente são abandonados. Isso só pode ser alcançado por meio do shikantaza. Queimar incenso, prostrações, o nembutsu, penitências e leitura de sutras não são necessários”. Nos últimos 400 ou 500 anos, apenas Nyojo ensinou que podemos confrontar diretamente a mente dos Budas e Patriarcas por meio do shikantaza e nos tornarmos um com sua experiência. Pouquíssimos na China podem se comparar a ele. Não foram muitos os que identificaram o zazen com o Dharma de Buda, o Dharma de Buda com o zazen, e ninguém esclareceu a verdadeira forma do zazen como o Dharma de Buda.

O zazen da mente não é o mesmo que o zazen do corpo, e vice-versa. Há um zazen do shikantaza que difere do zazen em que corpo e mente foram abandonados. Quando corpo e mente são abandonados, atingimos a compreensão e a experiência dos Budas e Patriarcas e devemos preservar essa mente, examinando completamente seus aspectos.

Certa vez Buda Shakyamuni instruiu uma grande assembléia de monges: “Se alguém se senta na postura de lótus, realiza o samadhi no corpo e na mente. Ele alcança grande virtude, é respeitado por todos e seu esplendor é como o do sol iluminando o mundo inteiro. Indolência e preguiça são lançadas fora e ele se torna luminoso e incansável; a mente da iluminação é radiante e brilhante. Sua forma é como a de um dragão serpenteante. Quando Mara vê a pintura de alguém na postura de lótus, enche-se de horror e medo. Quão maior será esse terror se ele vir a postura de lótus de um iluminado?”

Se apenas a pintura da postura de lótus já subjuga Mara, quão grande deve ser a ilimitada virtude da postura em si! Portanto, quando sentamos em zazen, realizamos uma alegria e uma virtude sem medidas.

Shakyamuni também disse a uma grande assembléia de monges: “É por isso que me sento na postura de lótus”. Ele então disse aos seus discípulos para se sentarem na postura de lótus. Aquele que não encontraram o Caminho buscam-no valendo-se de inumeráveis posturas – andando nas pontas dos pés, permanecendo sempre de pé, cruzando as pernas atrás do pescoço etc. –, mas eles estão submersos num oceano de enganos e sua mente nunca está em paz. Por esse motivo Shakyamuni instruiu seus discípulos para se sentarem aprumados na postura de lótus. Se nos sentamos aprumados, nossa mente se alinha, e sua dispersão e perambulação é trazida para a unidade. Se nossa mente se perde ou nosso corpo oscila, essa postura pode recolocá-los na ordem correta. Se você pretende entrar em samadhi, deve deixar que todos os seus pensamentos errantes e dispersos repousem. Pratique dessa forma e você atingirá o Rei de todos os Samadhis.
Portanto nós claramente entendemos que a postura de lótus é o Rei de todos os Samadhis. É a compreensão. Todos os outros samadhis lhe são subordinados. A postura de lótus é um corpo aprumado, uma mente resplandecente e o corpo e mente das coisas como elas são, que conduz diretamente aos Budas e Patriarcas, à prática correta e à iluminação, e à existência última de todas as coisas na natureza-de-Buda.

Podemos concretizar o Rei dos Samadhis por meio da postura de lótus neste mesmo corpo – em nossa pele, carne, ossos e tutano. Buda Shakyamuni sempre usou essa postura e a transmitiu a seus discípulos, ensinando-a tanto para homens como para deuses. Desde os sete Budas do passado, a essência do Caminho de Buda é a postura de lótus.

Enquanto Buda Shakyamuni se sentou na postura de lótus sob a árvore Bodhi, inúmeros kalpas se passaram. Porém, independentemente do tempo que se passou – 50 ou 60 kalpas, 21 dias ou apenas um breve instante –, ele fez girar a roda da Lei. O ensinamento de Shakyamuni é completo e não tem lacunas. A postura de lótus contém em si mesma todos os sutras. Um Buda encontra o outro nessa postura, e todos os seres sencientes tornam-se Budas nesse instante.

Quando o primeiro Patriarca, Bodhidharma, veio do oeste, ele passou nove anos sentado em frente a uma parede no monastério de Shositsu Hoshorinji, no Monte Su. Desde então, a essência e a semente do Dharma se espalharam por toda a China. A postura de lótus era o sangue vital do primeiro Patriarca. Antes de ele ir à China ninguém conhecia tal postura. Por toda a nossa vida devemos, portanto, nos empenhar, dia e noite, em praticar a postura de lótus e não abandonar o monastério – esse é o Rei de todos os Samadhis.

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