terça-feira, fevereiro 23, 2010

Apego e confusão

Apego/desapego. Eis um conceito muito confuso porquê em grande parte das vezes entendido de forma superficial, observado com uma mente condicionada, fechada em si mesma. A questão é que palavras e logo conceitos são inerentes à nossa condição humana atual, porém, quem é que tem TEMPO de ir além das palavras? O budismo se utiliza também de palavras para expressar sua "pedagogia", mas palavras são vazias, são formas apenas, e nela depositamos o que queremos, e cada um deposita uma coisa diferente e acaba fixando uma forma (a "sua" forma de ver porquê acredita também numa identidade pessoal fixa), se apegando a esta forma, e aí começa todo o conflito e sofrimento.

Aprofundando-se na percepção da natureza intrínseca de todas as coisas, a verdade é muito simples, mas ela só é realmente observável direta e individualmente, ninguém pode ter um insight por outra pessoa. Esta natureza é simplesmente o fato de que tudo, absolutamente tudo neste universo está se movendo: movo meu corpo enquanto ando, dentro dele o suco gástrico se desloca e reage com diversos alimentos que se moveram até o estômago, são plantas que foram regadas, e se moveram em direção à luz, e que brotaram num solo preparado a partir de uma semente, dentro da semente há átomos semelhantes aos meus, que por sua vez estão continuamente se combinando e recombinando em novas estruturas, e dentro destes átomos os elétrons e neutros estão em constante movimento, tudo isso sobre uma placa tectônica da crosta terrestre que se move (onde estão meus pés), num planeta que gira sobre si mesmo e ao redor de uma estrela chamada sol, que está se resfriando e um dia vai morrer... Veja, nem o sol escapa do movimento, porquê nós humanos escaparíamos? Porquê nós teríamos a capacidade de fixar as coisas? Na verdade isto só acontece dentro da nossa mente deludida, e em nenhum outro lugar real deste universo, o universo não conhece "parar", não há objeto que não se mova incessantemente, então poderíamos até mesmo mudar a palavra "objeto" para "movimento", já que tudo está se transformando, se deslocando de um ponto no espaço-tempo para outro ponto no interior da eternidade.

Apego nada mais é do que pretender fixar as coisas, que é a mesma coisa de acreditar em algo fixo, isto é apego no sentido budista, nada mais. E aí estão dois erros comuníssimos: a crença e a fixação. O budismo não requer crença pois não acredita na imobilidade - isto é a tal da impermanência. Budismo são olhos que vão além dos olhos e observam plenamente, e isto acontece através da prática do zazen shikantaza.

Então eu posso ter um carro, uma casa, dinheiro, mulher, marido, filhos, um iate, um cancer, uma dor, uma tristeza. "Ter" aqui tem o sentido de "estar com" por um período determinado, apenas isso, observar isso profundamente a todo instante é desapego, estar preparado para deixar ir quando for o momento é desapego. Deixar vir, deixar ir é desapego. Observar nitidamente este fluxo é estar neste fluxo, é findar o apego, é ser livre, profundamente livre, mas, quem quer, de verdade, até a raiz do cabelo?

sexta-feira, fevereiro 19, 2010

Deus é nada

Documentário de Tânia Quaresma. Mostra um sesshin no mosteiro Pico de Raios em Ouro Preto com o mestre Tokuda em 1992. Há no final um teishö (palestra).

Mosteiro Zen Pico de Raios from Tokuda Igarashi on Vimeo.

Hoon Sesshin

a quem devemos agradecer
pelo bem e mal?

terça-feira, fevereiro 09, 2010

Sesshin

O sol nasce para todos e a ninguém cobra

Alguns pensam que querem se aproximar do fogo.
E quando pensam muito, pensam o que todos pensam
e pensando que pensam corretamente desistem

Outros se aproximam do fogo, mas só um pouco
- isto já é o suficiente, nada de avermelhar a pele
queimar então é que não, vão até onde chegam
seus óculos escuros e protetores solar, desta ou daquela marca

Outros sim, estão dispostos, se aproximam muito do fogo
e por horas o encaram, as faces vermelhas, os olhos em chamas
até chamuscam, estes ficam íntimos, nem se importam
com o calor, se expõem como são, sem proteções
mas quando chega o momento de se deixarem torrar em labaredas, são tomados pelo medo e se afastam, mantêm distância, mínima, mas mantém

Mas há os que se aproximam tanto, tanto, que seus pés
se acendem como lâmpadas e sua mente que também arde
se abre como uma flor no jardim dos budas, e tudo
fica indizivelmente claro. E desse jardim já não retornam
embora estejam aqui: sentando, comendo, varrendo e cantando.

E por último há aquele que encontra o centro do fogo
e lá permanece, e estando lá está aqui, destes só ouvi falar.