sexta-feira, abril 30, 2010

Aprendendo com o silêncio

Numa certa ocasião, assistia a uma sessão de mondo, lá no Mosteiro Pico dos Raios, em Ouro Preto, quando um monge foi questionado: “O que o teu mestre te ensinou?”. Manteve-se em dúvida por alguns momentos, pensando na melhor resposta. Eis que, do fundo ouvimos com estrondo. “Só ensinei o silêncio”, dizia energicamente o monge Tokuda Igarashi.
Aprender a silenciar é a maior das sabedorias. Quando estamos diante da imagem de Buda, ele diz sem proferir palavra alguma. Mas os deludidos querem argumentar e contra-argumentar, caindo nas malhas da ilusão. Quando um iludido comete uma provocação os outros respondem imediatamente, caindo também na ilusão. Quando um Buda se mantém em silêncio, todos os outros se tornam Buda e silenciam-se.
Mas estamos à mercê do apego, da raiva e da ignorância. São conhecidos por três venenos. Toda vez que as três raízes maléficas se juntam existe o confronto, pois o outro, provocado e provocador se tornam um na ilusão. Diante de uma pedra atirada, não se deve revidar, nem por legítima defesa. Se levar um chute não revida. Se levar uma cuspida, não revida. Assim agem todos os mahasattvas, os bodhisattvas, todos os arhats. Que possamos aprender com os erros cometidos mas cair novamente no erro é uma questão de bom senso.

quarta-feira, abril 28, 2010

sexta-feira, abril 23, 2010

SESSHIN NO TEMPLO TAIKAN-JI

MAIO DE 2010 - ORIENTAÇÃO: MONGE ENJÔ



LOCAL: Templo Taikan-ji – Pedra Bela – São Paulo.
DATA: dias 1 e 2 de maio de 2010, com chegada dia 1, às 8h30min. Os interessados poderão chegar no dia 30 de abril, à tarde. É necessário informar esta opção.
INFORMAÇÕES / INSCRIÇÕES: até 24 de abril, pelo e-mail. zencampinas@uol.com.br.
CONTRIBUIÇÃO: R$80,00/dia (inclui todas as refeições e hospedagem). A contribuição deve ser feita antecipadamente. Exclusivamente aos membros praticantes regulares da AZC que não puderem custear os valores acima, é oferecida a possibilidade de contribuir apenas com meia diária. A chegada na sexta-feira, dia 30, não importa em uma terceira diária.
ATENÇÃO: Os que têm restrições alimentares devem informá-las. É possível a participação somente em um dos dias acima. É necessário informar essa opção.
CARONA: Estamos organizando esquemas de carona. Os que desejarem participar, favor informar.
LEMBRETES: Usar roupas discretas, leves e folgadas, de preferência na cor preta para o zazen e confortáveis e discretas para o samu (trabalho comunitário) e trazer chinelos para uso pessoal, farolete, roupas de cama, cobertor e artigos de higiene pessoal. Poderão ser utilizados zafus próprios.
Que todos possam se beneficiar. Aguardamos sua participação e boa prática!

quarta-feira, abril 21, 2010

Essa vida

A rosa branca do quintal sempre morre.
Os pardais pousam por aqui há quantas gerações?
Formigas de perto são uma, um passo atrás e são um único cordão.

Então ouvi: Morra
Morra de morrer.
Morrer de não ficar
entre ciprestes e cicatrizes.

E soou assim:
Morra o significado
morra o "momento presente"
e morra o ausente
Morra o sujeito
e morra o crucificado

Morra o cognitivo
morra o epistemológico
e morra o transcendente
Morra o "ovo da serpente"
morra a metonímia e o legal
e morra o ideal

Morra o caro
e "o que não tem preço"
Morra a iluminação
e morra a compaixão
Morra a cura
Morra "eu sempre me esqueço"
e morra Buda
Morra o "medo que dá".

E mais:
Morra 108 vezes, diga:
"Morra" esse tanto:
Morramorramorramorra
morramorramorramorra
morramorramorramorra
morramorramor...

E reste um coração suspenso em tripas trêmulas,
a bater o tempo mudo que nasce quando tudo acaba.
Pois é morrendo que se vive este presente sem fim.

domingo, abril 18, 2010

Invariável

A imobilidade é uma ilusão —
costura teus olhos na primeira nuvem.
O silêncio é a verdade,
livra-te disso e daquilo.

segunda-feira, abril 12, 2010

De onde vem a música

Das Vantagens de Ser Bobo

Clarice Lispector

O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar o mundo. O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo. Estou pensando."

Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia.

O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver. O bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski.

Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto seria caríssimo: mais valia comprar outro. Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranqüilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado. O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que venceu.

Aviso: não confundir bobos com burros. Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a célebre frase: "Até tu, Brutus?"

Bobo não reclama. Em compensação, como exclama!

Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu. Se Cristo tivesse sido esperto não teria morrido na cruz.

O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos. Ser bobo é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os espertos não conseguem passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em compensação os bobos ganham a vida. Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem.

Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita ser bobo. Ah, quantos perdem por não nascer em Minas!

Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo.

terça-feira, abril 06, 2010

Leis

São três tipos de leis. Leis místicas, existencias.

1. As leis do Dharma: são as leis da natureza, do universo. Que regem as ventanias e a intensidade das brisas. A forma molecular dos cristais e dos rochedos, o carbono e o hidrogênio que constituem a nós e às estrelas do firmamento. Somos um só corpo, o corpo da humanidade, o corpo do dharma. Aqui não há sequer pensamento de "fugir", "escapar", "não aceitar", "modificar" ou "não participar" da lei, qualquer pensamento deste tipo é delusivo, imaturo e perigoso. Perigoso para o corpo da humanidade, perigoso para as outras pessoas e para si. Neste caso a palavra lei pode não ser das mais agradáveis para todos os ouvidos, mas, aqui, pode ser substituída por sabedoria.

Como poderia haver algo mais verdadeiro do que a nossa própria constituição à semelhança do universo?

2. As leis da sociedade e da família: são as leis do coletivo, dos homens e mulheres. As leis necessárias para que possa haver um corpo social em harmonia (mínima pelo menos) para a coexistência. Estas leis evidentemente são muitas vezes arbitrárias, circunstancias e conservadoras. Causadora de constantes conflitos porque são verdades para uns e não necessariamente para outros. Movem-se no ritmo dos desejos de alguns poucos e de um coletivo confuso e não esclarecido, a ser conduzido. Pode-se dizer: de um coletivo formado por pessoas que não querem e acreditam não terem tempo, nessa vida, para abandonar a delusão. E é assim, as coisas estão no seu devido lugar, pretender revolucionar a sociedade é criar novas leis destas, não resolverá. No entanto é preciso sim, que haja leis do tipo 2, precisamos conviver, somos seres sociais, um só corpo, segundo a primeira lei. Estas leis devem, em sua grande maioria serem abandonadas, o quanto antes. Mas, importante: as leis são abandonadas dentro de nós mesmos, não deveríamos querer convencer os outros arbitrariamente, não há abandornar por outro, e não há necessidade de estourar bombas e revolucionar o mundo, ou outra forma qualquer ostensiva e agressiva. Lembre-se, somos um só corpo, se eu mudo, o mundo já não é o mesmo.

Estas leis são os deveres sociais, como se já nascêssemos em dívida, isto é falso, precisa ser observado. Estes "tem que" da sociedade podem ser abandonados em benefício da própria sociedade.

3. As leis pessoais: aquelas que criamos para nós mesmos e que portanto não têm existência intrínseca. Que incorporamos sem saber (ou não), pela educação, cultura, carências, insegurança e experiências boas e más no passado. Todo eu particular (ego), centro das leis pessoais, carece ser mantido e autoafirmado, a todo momento, porque está fadado a se despedaçar no próprio movimento do dharma (a roda da lei). Esta é a maneira que desenvolvemos para viver num mundo incompreensível, misterioso e contraditório. Este tipo de lei deve e pode ser abandonada, completamente, agora mesmo. E ao fazermos isto, consequentemente surge radiante a sabedoria, nossa verdadeira natureza. Aberta ao mistério, porque participa dele, aberta à contradição, que já não há.

O ego pode criar uma grande resistência à percepção do dharma, e neste momento ele talvez esteja cheio de argumentos e justificativas para reafirmar sua existência. Mas não há porquê se preocupar, como seres manifestados precisamos dele, do ego, claro. Veja, o ego é só um nome para uma construção mental. Neste caso, o único ego que precisamos é aquele que nos ajuda a manter ele próprio vazio a todo instante, isto é, sem nenhuma experiência boa ou má cristalizada. Sem segurar o que quer que seja, sem acreditar que possui algo. Este eu, que assim vai além do ego, não precisa acreditar, não precisa crer, ele sabe, sabe porque observa este movimento de autoconstrução circunstancial constante mas não prega um prego, não enterra no solo uma viga sequer, ele apenas observa este fluxo sem paradeiro. Como os primeiros da nossa espécie, a sabedoria é nômade, ela não precisa construir casas porque ela já está em casa.

Neste tipo de lei pessoal, a ser abandonada, o pior seria querer que outros forçosamente acreditassem nelas também. Seria um pequeno terror, desejar que outros incorporem as leis que desastrosamente inventamos para nós. Seja por vias sutis ou diretas. Por outro lado, ao nos libertarmos, libertamos também o outro.

- A dimensão psicológica prende-se aos aspectos das leis 2 e 3 e portanto deve ser abandonada. Abandonar não significa que a parte psicológica da mente, digamos assim, irá desaparecer, significa que esta não será mais dominante e será encarada apenas como mais um aspecto da existência.