segunda-feira, junho 30, 2008

Sangha de Floripa

A sangha de Florianópolis reunida em mais um retiro, no último mês de maio, em Cachoeira do Bom Jesus.




"Abandonei mente e corpo. Por pensar que tenho corpo e mente, é que me sinto só; mas quando percebo que tudo é apenas uma centelha na vastidão do universo, me sinto muito forte e minha existência, plena de significado. Esta é a nossa prática."

Inspirada nos textos de Shunryu Suzuki. /\;
Michel V. Cunha.

sexta-feira, junho 27, 2008

Fazer o bem, não fazer o mal. Manter a mente pura.

Esta história me fez lembrar um dos preceitos budistas, expresso no título desta postagem. Seria possível fixar as regras do bem e do mal? Não estariam estes dois conceitos sujeitos á lei da impermanência? Como propõem os mestres, buscamos a sabedoria dentro de nós mesmos através do descondicionamento da mente, indo além do bem e do mal.

Acompanhe a seguir:

Ativistas tentam libertar indiano preso por fazer de urso animal de estimação



Associated Press
Em Nova Déli (Índia)

Era para ser um conto de fadas de um homem que tirou das florestas do leste da Índia um urso órfão e o levou para casa para criá-lo como parte de sua família, consolando a filha pequena que havia acabado de perder a mãe. Mas quando funcionários de uma entidade do governo indiano conheceram a história na imprensa indiana, na última semana, o conto de fadas dissipou-se.

Ram Singh Munda, 35, foi preso por violar leis do país, que proíbem a domesticação de animais selvagens; o urso foi enviado a um zoológico onde tem se recusado a comer e a filha, de seis anos, foi mandada de navio a um orfanato estatal.

Agora, ativistas de defesa dos animais, impressionados pelo ato de Munda, estão protestando por sua liberdade. "Condenamos fortemente a maneira como os funcionários do departamento florestal prenderam o pobre analfabeto que não sabia da legislação do governo", disse nesta terça-feira Jiban Ballav Das, chefe do grupo "Pessoas pelos Animais" da província de Orissa.

Munda, um trabalhador que pertence a uma tribo indígena que mora na floresta 200 quilômetros ao norte da capital da província, Bhubaneswar, disse que encontrou o filhote de urso no ano passado quando recolhia gravetos.

Ele levou o urso, chamado Rani ("Rainha", em português), para casa e fez dele seu animal de estimação.

Imagens de TV gravadas antes da prisão mostram o urso brincando com a filha de Munda, Dulki, enquanto tentam subir na traseira da bicicleta do indiano.

Se for condenado, Munda pode ser condenado a até três anos de prisão. "Eles me prenderam. Como minha filha sobreviverá?", disse Munda a uma subsidiária da rede americana CNN enquanto era levado para a prisão. "Não entendo porque fui punido por cuidar de um urso que havia sido abandonado na floresta e que teria morrido se eu não o tivesse trazido para casa".

O diretor do zoológico de Nandan Kanan, para onde Rani foi levado, defendeu a decisão do governo. "Munda foi preso em respeito a uma lei que tem como intenção proteger a vida selvagem", disse.

Entretanto, o ativista Jiban Das afirma que apesar de condenar a retirada de animais do meio selvagem, apóia a atitude de Munda de tentar recuperar o urso e diz que o governo está sendo muito rigoroso. "Ele nunca torturou o animal, nunca o utilizou para propósitos comerciais. Portanto, não deveria ser preso", disse Das.

No zoológico, Rani está em uma jaula isolada e está se recusando a comer. "Os ursos desenvolvem grandes laços com os seres humanos e são muito ligados a seus tratadores", disse Biswajit Mohanty, secretário da "Sociedade para a Vida Selvagem" de Orissa.

Já Das afirma que Munda ganhará um emprego assim que for solto. "Decidimos dar a ele um emprego em nosso centro de reabilitação de animais".

quarta-feira, junho 25, 2008

Sim, não há fronteiras


Mestre Saikawa prepara-se para o zazen.

"Cada vez mais a vida numa cidade grande, como São Paulo, vem enfrentando as conseqüências de seu próprio crescimento. Há falta de transportes e, por ironia, aumenta o número de veículos domésticos nas vias públicas. Não somente isso, a poluição principalmente nos dias de inverno torna o ar denso e não apropriado para a inalação. Sem contar a quantidade de pessoas que trafegam pelas ruas, muitas delas em situação crítica: desemprego, sub-emprego, aposentados, marginalizados e policiais.

Rostos anônimos que desconhecem a amizade e qualquer tentativa de aproximação pode ser vista com desconfiança. Neste caldeirão social que ferve com todos os seus conflitos, sem que possa resolver os problemas, repartimos a geografia física. São Paulo é uma grande bolha espacial e psicológica. Pela manhã a correria nos pontos de ônibus, estações de metrô e pedestres calcando o chão ainda fresco de uma noite nem sempre calma. Após horas de labuta, antes que anoiteça o processo se repete: a multidão se forma. E assim, um dia se foi. São Paulo está condicionado a produzir sempre, independente das condições emocionais de seus habitantes.

Em cada rua trafegada, as marcas dos pés acabam deixando rastros invisíveis e impregnados de sentimentos. As vozes abafadas do centro continuam ecoando no silêncio da alma. São Paulo não cessa de respirar uma única vez. No avançar da noite, outros ocupantes vão se dispersando como saídos de seus ninhos protegidos pelos murais de concreto: seres fluidos usando roupas espaciais em constante metamorfose.

Qualquer tentativa de reverter esta situação nos parece duvidosa. Entretanto, aquiescermos diante das condições apresentadas seria irônico. Levando em consideração a quantidade energia desencontrada, devido a sua diversidade de interesses, classes e padrões culturais, o que converge é justamente a ocupação territorial. Todos somos paulistas apesar das diferenças. O que se pode fazer então? Criar condições para a criação de harmonia. E podemos falar em harmonia quanto existe justamente a diferença. Se a diferença existir enquanto diferença apenas, a harmonia não poderá se fazer presente. Mas a convivência na diferença, penetrando nos meandros de sua aparente contradição faz surgir a harmonia e conseqüentemente a compaixão.





Método
Acreditando que o mundo ocorre numa rede de interdependência, na qual uma ação ou não ação acaba repercutindo em todos os cantos, a atuação proposta é a meditação vazia (zazen) realizada no alto de um edifício na cidade de São Paulo. Ficar em postura meditativa com a mente alerta é capaz de produzir a harmonia desejada. De maneira objetiva não vai resolver os problemas da grande metrópole mas subjetivamente, através da sintonia entre as mentes, uma calma poderá surgir. Na verdade, a mente de todos os habitantes desta metrópole, 12 milhões, são uma mente única. Desencadear uma reação harmoniosa só é possível quando uma parte mínima desta mente provoque um choque em rede."
Texto: Jisho


Seigen, Saikawa Roshi, Jisho e Wajun no dia 20/06.

terça-feira, junho 17, 2008

Gratidão



Esmaece a foto
do ascendente samurai.
Início de outono.
Wajun

dia de outono
floresce nos trópicos
o Dharma de Buda
Koun

Gente do Nihon
trazem frutos e raiz.
Como sou grato!
Seigen

No jardim do tempo
um canteiro semeado.
Incontáveis mãos
Wako

Na ponta da enxada
nas costas do agricultor
o grilo passeia.
Jisho

100 anos de imigração japonesa no Brasil. Domingo passado fizemos juntos, monges e praticantes leigos do Busshinji, uma pequena homenagem aos imigrantes japoneses, que atravessaram e ainda atravessam o mundo para enriquecer nossa vida com sua cultura. Permitindo assim que o Zen chegasse até nós.

Na foto acima, vê-se à direita o pai do Jisho, ainda rapaz numa plantação de algodão no interior de São Paulo.

segunda-feira, junho 09, 2008

Transmissão


A mente do grande sábio da Índia estava intimamente ligada de leste a oeste.
Entre seres humanos, há sábios e tolos, mas no caminho não há patriarcas do sul ou do norte.
A fonte sutil é clara e brilhante; os rios ramificados fluem através da escuridão.
Estar apegado às coisas é ilusão; encontrar o absoluto ainda não é a iluminação.
Um e todos, o sujeito e o objeto estão relacionados e, ao mesmo tempo, são independentes.
Estão relacionados, mas funcionam diferentemente,
apesar de cada um manter o seu próprio lugar.

A forma faz com que o caráter e a aparência sejam diferentes;
os sons distinguem o conforto e o desconforto.

A escuridão faz todas as palavras serem uma; o brilho distingue frases boas e más.
Os quatro elementos retornam à sua natureza assim como uma criança retorna à sua mãe.

(Sekito Kisen, Sandokai)

domingo, junho 08, 2008

Textos e autores

A prática fundamental do Zen é o Zazen, que literalmente significa “meditação sentada”. Dentro da linhagem Zen, podem ser distinguidas duas formas de praticar o Zazen: Shikantaza (apenas sentar) e Koan (meditação sobre um caso). Na linhagem Soto Zen pratica-se tradicionalmente o Shikantaza. Por isso, em textos e nos ensinamentos da Soto Zen, quando se fala em Zazen quer-se referir ao Zazen Shikantaza.

A prática do Zazen Shikantaza remonta à iluminação de Buda Shakyamuni, que se deu há mais de 2500 anos, na Índia. Transmitida de mestre a discípulo face a face, foi levada da Índia para a China por Bodhidharma, por volta do século V d.C. No século XIII, Dogen Zenji viaja do Japão à China, onde a aprende com seu mestre Tendo Nyojo, disseminando-a posteriormente ao retornar a seu país.

Por ser substancialmente uma experiência concreta, realizada e transmitida com o próprio corpo, e não uma doutrina teórica, são poucos os textos clássicos que abordam o Shikantaza. Entre os mestres chineses encontram-se ecos de menções a essa prática em alguns poemas, que se referem a ela como “Iluminação Silenciosa”. É Dogen Zenji que adota e estabelece a denominação Shikantaza: apenas sentar. Em seus textos Dogen e outros mestres geralmente se referem ao Shikantaza simplesmente como Zazen.


Dogen Zenji (1200-1253)

Dogen Zenji é o fundador da linhagem Soto Zen no Japão.
Em 1225 empreende viagem à China, onde, sob orientação de seu mestre Tendo Nyojo, aprende o Shikantaza (nome que Dogen atribui à prática da “Iluminação Silenciosa”, que seu mestre ensinava) e logra alcançar a iluminação.
Ao retornar ao Japão, compõe Fukanzazengi e outros textos em que apresenta instruções e aspectos do Shikantaza.

Fukanzazengi
Zazengi
Zanmai-Ozammai
Zazenshin

Koun Ejo (1198-1280)

Koun Ejo foi discípulo de Dogen Zenji. Em Komyozo Zanmai, apresenta orientações e advertências sobre o Zazen Shikantaza.

Komyozo Zanmai

Keizan Zenji (1268-1325)

Keizan Zenji também é considerado, ao lado de Dogen Zenji, fundador da linhagem Soto Zen no Japão. Em seus textos sobre o Zazen Shikantaza, Keizan reforça as instruções de Dogen e acrescenta outras orientações.

Zazen-Yojinki
Sankon zazen setsu

Hongzhi Zhengjue (1091–1157)

Hongzhi Zhengjue foi um importante mestre chinês que ensinou no mosteiro do Monte Tiantong, onde anos mais tarde Dogen Zenji encontraria seu mestre. Hongzhi é responsável pela formalização em texto da prática da “Iluminação Silenciosa”, que Dogen posteriormente denominaria Shikantaza.

Iluminação silenciosa
Cultivando o campo vazio


Sekito Kisen (700 - 790)

Sekito Kisen foi discípulo do sexto patriarca na China. Em Soanka, Sekito apresenta importantes observações e instruções sobre o Zazen Shikantaza.

Soanka

Soto Zen Shu

A Soto Zen Shu representa a linhagem Soto Zen oriunda de Dogen Zenji. Presente em inúmeros países atualmente, tem sua sede no Japão, onde se encontram os dois templos-sede: Eiheiji e Sojiji. Em suas publicações, assim como em seu website, são apresentadas orientações sobre como praticar Zazen.

Guia com imagens

quarta-feira, junho 04, 2008

Após derrame, neurocientista alcança "o nirvana"

A neurocientista Jill Bolte Taylor trabalhava no centro de pesquisa cerebral da Universidade Harvard quando chegou ao nirvana. Mas o fez tendo um derrame. Em 10 de dezembro de 1996, Taylor, que então tinha 37 anos, acordou em seu apartamento perto de Boston com uma dor penetrante por trás do olho. Um vaso sangüíneo havia estourado em seu cérebro. Em poucos minutos, o lobo cerebral esquerdo - a fonte do ego, da análise, do juízo e do contexto - começou a falhar. Estranhamente, a sensação era ótima.

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O ruído incessante que costumava ocupar seus pensamentos desapareceu. As preocupações cotidianas de sua vida - sobre seu irmão esquizofrênico e seu emprego desgastante - romperam as amarras e se foram. E suas percepções também mudaram. Ela começou a perceber os átomos e moléculas de seu corpo e como eles se combinavam com o espaço que a cercava; o mundo todo e as criaturas que ele contém eram todos parte do mesmo, e magnífico, campo de energia reluzente.

"Minha percepção das fronteiras físicas deixou de estar limitada ao contato de minha pele com o ar", escreveu Taylor em My Stroke of Insight, seu livro de memórias, que acaba de ser publicado. Depois de experimentar dor intensa, ela afirma, seu corpo se desconectou de sua mente. "Eu me sentia como um gênio libertado da garrafa", afirma no livro. "A energia do meu espírito parecia fluir como uma grande baleia percorrendo um mar de euforia silenciosa".

Enquanto seu espírito ascendia, seu corpo lutava pela sobrevivência. Ela tinha um coágulo do tamanho de uma bola de golfe no interior da cabeça, e sem o uso do hemisfério esquerdo do cérebro, ela perdeu funções analíticas como a capacidade de falar, de compreender números ou letras e, inicialmente, até a de reconhecer sua mãe.

Um amigo a levou ao hospital, onde passou por uma cirurgia, seguida por oito anos de recuperação. O desejo de contar aos outros sobre o nirvana, conta Taylor, a motivou fortemente a reintroduzir seu espírito no corpo e se curar.

A história de Taylor não é comum entre os pacientes de derrames. As lesões no lobo esquerdo do cérebro em geral não conduzem a uma prazerosa iluminação; as pessoas muitas vezes afundam em um estado de irritabilidade constante, e perdem o controle de suas emoções. Taylor também foi ajudada pelo fato de que o hemisfério esquerdo de seu cérebro não foi destruído, e isso provavelmente explica porque ela conseguiu se recuperar plenamente.

Hoje ela se diz uma nova pessoa, capaz de "penetrar a consciência de meu hemisfério direito" sempre que assim deseja, e de ser "uma com a totalidade da existência". E ela diz que isso nada tem a ver com a fé, e sim com a ciência. Taylor oferece profunda compreensão pessoal a algo que havia estudado por muito tempo: a grande diferença entre as personalidades das duas metades do cérebro.

O hemisfério esquerdo em geral nos fornece contexto, ego, tempo, lógica. O hemisfério direito nos oferece criatividade e empatia. Para a maioria das pessoas de fala inglesa, o hemisfério esquerdo, que processa a linguagem, é dominante. A percepção de Taylor é que isso não tem necessariamente de ser verdade.

A mensagem dela, a de que as pessoas podem escolher viver uma vida mais pacífica e espiritual deixando de lado a porção esquerda do cérebro, atrai muita gente.

Em fevereiro, ela palestrou na conferência TED, sobre tecnologia, meio ambiente e design, um fórum anual para a apresentação de idéias científicas inovadoras. O resultado foi eletrizante. Depois que sua palestra de 18 minutos foi postada no site da TED, ela se tornou uma espécie de celebridade instantaneamente.

Mais de dois milhões de pessoas assistiram ao vídeo, e mais de 20 mil ao dia continuam a fazê-lo. Ela também concedeu uma entrevista veiculada no site de Oprah Winfrey e foi escolhida como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo em 2008, pela revista Time.

Também recebe mais de 100 e-mails de fãs ao dia. Alguns deles são cientistas especializados no estudo do cérebro, fascinados com o fato de que uma colega tenha sofrido um derrame e agora tenha podido retornar e traduzir essa experiência nos termos que eles estão acostumados a empregar. Outros são vítimas de derrames ou profissionais de saúde que trabalham nessa área, interessados em contar suas histórias e em agradecê-la pela franqueza.

Mas muitos dos que a procuram têm interesse em fenômenos espirituais, especialmente budistas e praticantes de meditação, para os quais a experiência pela qual ela passou confirma sua crença de que existe um estado de alegria ao qual se pode chegar.

Taylor decidiu estudar o cérebro - e obteve um doutorado em ciências com especialização em neuroanatomia -, porque seu irmão enfrentava uma doença mental e sofria ilusões de que estava em contato direto com Jesus. E de seu antigo laboratório de pesquisa em Harvard, ela continua a falar em defesa das pessoas mentalmente doentes.

Mas reduziu sua carga imensa de trabalho. Ela vive em beco arborizado a alguns minutos de distância da Universidade de Indiana, onde fez seu curso de graduação e onde hoje leciona na Escola de Medicina.

O vestíbulo da casa está pintado de uma cor púrpura intensa. Ela recebe os visitantes com abraços calorosos e, quando fala, seus olhos de um azul pálido não se desviam dos olhos de seus interlocutores. Solteira, ela vive com seu cachorro e dois gatos, e não hesita em definir sua mãe, 82 anos, como sua melhor amiga.

Taylor diz que escreveu suas memórias porque acredita que haja muito de aproveitável em sua experiência, no que tange à recuperação de pacientes de trauma cerebral.

Quanto a questões mais sérias, como a paz mundial, ela diz que não sabe como atingi-la, mas acredita que o hemisfério direito do cérebro possa ajudar - ao menos foi o que disse na conferência TED. "Creio que quanto mais tempo usarmos os circuitos de paz de nosso hemisfério direito, mais paz projetaremos no mundo, e mais pacífico será o planeta". Quase parece ciência.

Tradução: Paulo Migliacci ME