terça-feira, fevereiro 27, 2007

Sesshin de Carnaval

Handa San escreveu e publicou recentemente neste blog um texto reflexivo intitulado:Lembranças de outros sesshin.
Inspirada no conteúdo e beleza de suas palavras tento expressar,com simplicidade,aquilo que vivi em outro sesshin.Este,realizado na Pousada Passarim.
A Pousada Passarim,construída numa reserva particular do patrimônio natural está localizada a 70km de Florianópolis.
Ali,o silêncio só é interrompido pelo barulho da chuva ou da água que escorre no regato,pelos sons dos pássaros e animais ou pelo vento que ouço balançar os galhos das árvores.
No dojô estão 14 participantes,2 de Curitiba,1 de Rio do Sul e os demais de Florianópolis.Orientados por Monge Genshô e em silêncio sentam-se em zazen.É dado início ao sesshin de carnaval.
Da cozinha ouço os sons dos instrumentos que ressoam do zendô.Momentaneamente divago e sinto o coração inquietar-se.
Da janela observo as árvores que balançam suavemente protegidas pelo escuro de mais um dia que nasce.A brisa fresca chega até à cozinha.A água na chaleira ferve,interrompendo minhas divagações.De repente,sei que a refeição matinal deve ser preparada.
Minhas apreensões se dissipam como névoas dispersas pelo vento.
Os ajudantes apresentam-se à cozinha e eu os oriento a cortar as frutas em formas,tamanhos,regulares e harmoniosos e misturados colorem a tigela.
Logo,os praticantes são servidos.Com energia e ânimo restabelecidos retornam à pratica do retiro em atividades de zazen,kin hin,samu,palestra do Dharma,refeições etc.
Na cozinha os praticantes alternam-se como ajudantes.Atenta,acompanho o movimento de cada um - o uso da faca,o corte das frutas e dos legumes,o preparo dos temperos,o manuseio dos recipientes,o uso da água,os restos e as cascas que são jogados no lixo,as portas que se abrem e se fecham,o serviço das refeições servido à mesa,cada movimento das mãos,dos pés,dos corpos.
Cada praticante traz para o dojô da cozinha sua experiência e sua história de vida que se expressam em cada movimento,em cada gesto.
A apreensão e compreensão de cada identidade presente nos gestos e movimentos exige atenção,paciência,flexibilidade e agilidade no pensar e agir.
O dojô da cozinha em movimento incessante e ritmo ordenado,flui e agrega quase magicamente a vida em ação:a água,o calor,os alimentos,o chá,a habilidade e a compassividade dos praticantes.
Último dia.É novamente alvorada.Do corredor contemplo o dojô principal.Atenta assisto parte da cerimônia matinal - choka.A energia do dojô me comove.
Compreendo que o lugar em que estou é o que faço dele.Preparar as refeições é na verdade,eu sinto,a mesma coisa que ouvir os ensinamentos ou sentar em zazen.
Com a mente silenciada e o coração tranquilo curvo-me em reverências a Buda e a seus ensinamentos.Duas jóias sagradas,dois faixos de luz a me conduzirem no estudo e prática do caminho.

sábado, fevereiro 24, 2007

O Caminhante

O olhar perde-se entre a imensidão do céu azul e o mar profundo.
Uma trilha indica o caminho a seguir.Uma trilha batida que se convencionou pisar.
Inadvertidamente, o caminhante segue por essa trilha.
Menos vizível, abre-se no meio da vegetação espesssa outra passagem, quase oculta e mais cativante.
Ali o caminhante encontra a si mesmo nas borboletas, nas árvores, flores, plantas, pedras, musgos, na cigarra morta no chão, nas folhas secas, nos galhos retorcidos...no silêncio e nas manifestações de vida e de morte.
Na montanha, como nos caminhos da vida cotidiana, podemos conduzir nossas vidas por trilhas batidas e repetir as mesmas coisas, os mesmos erros, os mesmos preconceitos ou deixar-nos fluir com o coração purificado pelo silêncio e ao conviver com cada manifestação da natureza, curvar-nos a sorrir e cantar.
O caminhante que assim é vive o aqui agora e celebra a imensidão do céu azul e do mar profundo a sua frente.
Mente e coração se unem em compreensão e amorosidade para apreciar a vida, reverenciá-la e vivê-la plenamente.

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Vida e Morte

A mãe às lágrimas à beira do caixão chora a morte da filha.
A mãe, aos 87 anos, enterra a filha que viu nascer e acolhida por seu amor cresceu, sorriu e viveu para então adoecer, sofrer e morrer.
A mãe inundada em lágrimas despede-se da filha e deixa um pouco de si no caixão.Resta-lhe talvez um sopro de vida para lembrar o que viveu.
Imersa nesta imagem que contemplo reflito sobre a vida e a morte.
"Uma borboleta passa por diante de mim" (*) e como o poeta aprendo que a borboleta é apenas a borboleta e assim a vida é apenas vida e a morte apenas morte.
Dois seres - a mãe e a filha manifestando-se em dois movimentos - a vida e a morte, tornam-se um.

(*) Alberto Caeiro