terça-feira, maio 13, 2008

Os fantasmas do zazen

Que tipo de zazen fazer?

Com freqüência ouvimos dizer de um ou outro: “o zazen de hoje foi bom”. O que quer dizer isso? Suponho que seja um zazen tranqüilo, sem dores nas pernas, com a mente mais concentrada. Na verdade, o que falta é uma prática mais intensiva de zazen. Não fazemos zazen para relaxar a nossa mente, nem para tornar as pernas mais flexíveis. Fazer zazen uma vez por semana é pouco, mas muito para quem faz uma vez por mês. Fazer duas vezes por semana é melhor do que fazer uma vez só. Mas duas vezes por semana pode ser pouco para quem faz três vezes ou quatro. Fazer zazen deve ser encarado como uma atividade normal como respirar, comer, tomar água, fazer as necessidades básicas exigidas pelo corpo.

Entretanto, por algum motivo, o zazen é encarado como uma atividade especial. Nem respirar, nem comer são assuntos especiais, pelo contrário. Se o zazen for realizado sem inserção em nossa rotina, então começaremos a falar “o zazen de hoje foi bom”, o “zazen de hoje foi difícil”. Esta separação em bom e mal só cria mais confusão ainda. Só existe o zazen do dia, independente de sua categoria. O zazen só deve ser realizado como parte de uma atividade comum, tal qual respirar, comer... Talvez deva se fazer o zazen sem ao menos pensar em estar fazendo zazen.<

Tem se ensinado com freqüência: “Quando você se senta sem zazen, impreterivelmente os pensamentos surgem. Quando acontecer isso, não toque no pensamento. Se o pensamento for agradável não o agarre para se lembrar depois. Se o pensamento for desagradável não o expulse. Deixe o pensamento vir, deixe o pensamento ir. Assim penetrem mais fundo no zazen e acabem com a dualidade. Tornem-se um com o universo”.

Desconheço o motivo, mas quando classifica-se o zazen de “bom” e “mal”, estamos esperando uma intenção no sentarmo-nos em zazen. Esta intenção é dispensável. Ainda que todos os zazen sejam mal, continuem sentando-se. O zazen “mal” pode ser, talvez, uma falta de concentração. Se isso for verdade, a dificuldade pode ser sanada por mais treino da mente e do corpo fazendo zazen. No caso, treinar a mente é tão importante quanto ao atleta que deve treinar o corpo. Um velocista tem de treinar muito a flexibilidade das pernas, os músculos, a velocidade e a mente. Da mesma forma, o praticante de zazen deve fazer zazen. Quanto mais se faz zazen, terá mais chances de conhecer a si próprio, de treinar a concentração, apaziguar os fantasmas da mente, controlar a respiração, disciplinar a ansiedade e diminuir a dor.

Mas não é tão fácil assim. Principalmente para aqueles que não tem o costume de sentar-se em zazen, ou senta-se pouco, esta prática requer uma disposição maior. Não se pode ensinar alguém a fazer zazen, sendo as dificuldades os momentos de melhor aprendizagem. Não obstante, arrisco-me em dar alguns conselhos. Os conselhos podem ser seguidos ou não. Eis a sugestão: no meio do zazen somos assaltados pelos pensamentos e, por alguns instantes a divagação nos arrasta numa cadeia incontrolável de emoções; a mente turva-se e torna-se impura; a pureza da mente é retomada quando me dou conta do que ocorre e imediatamente corto o ciclo do pensamento, alinho a coluna e respiro profundamente levando o ar ao abdômen e solto demoradamente pela boca. Faça isso e a mente se acalmará em instantes.

Se soubessem como o zazen é importante para a nossa qualidade de vida, de descondicionamento mental, do entendimento do dharma, da descoberta da compaixão, enfim da senda da Iluminação, não perderiam tempo com frivolidades. Ainda que em cada final de zazen repitamos “a vida e a morte são assuntos importantes, não percam tempo, iluminem neste instante”, continuamos deludidos. E a nossa delusão se tornou um apego. É uma pena, é uma pena. De qualquer forma, o momento para o entendimento não aconteceu ainda...

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