Era inverno quando fiz os votos para monge no Templo Busshinji. Nem mais me lembro qual era o dia. Lembro-me do mês: julho. Ano: 1989. Antes, por uns dois ou três anos vinha freqüentando as sessões do sábado. Tempos difícies aqueles. O Templo era uma casa antiga, construído no final do século XIX. Na verdade, eram duas as casas. Numa delas funcionava como escritório e Sala de Buda, também tinha nesta a sala de chá, a cozinha e instalações para o repouso dos monges. Na outra casa, ao lado, aos fundos, após avançar por um corredor sinistro, penetrava-se num ambiente em que encontrava-se um tambor velho, o taiko, uma tábua para ser batido, o moppan, e um sino enferrujado. Numa sala os visitantes sentavam-se e ficavam a espera do início do zazen. Pouco se falava ou quase nada. Era então o monge responsável pelas sessões de zazen o velho e saudoso Tiba. De poucas palavras, Tiba-san quebrava às vezes sua carranca de sobrancelha de taturana para receber os alunos. Quando acabava a sessão de zazen, todos dirigiam-se novamente à sala de espera e Tiba-san perguntava em seu português sofrível se alguém tinha alguma pergunta. Não se costumava perguntar muito. Só de olhar para a cara do Tiba-san qualquer um desanimava. Ficavam receosos. Tinham medo! Uma vez um novato encorajou-se e fez uma pergunta qualquer. Abstrato demais para o Tiba-san. Por isso, a pergunta encontrou um imenso vazio. Depois, Tiba-san olhou para todos e ensaiando um sorriso finalizou: "Não mais pergunta, boa noite, podem embora". Com os olhos muitas vezes úmidos, os alunos punham as mãos em gashô e reverenciavam o velho monge. Assim, comecei a entrar no universo Zen. De poucas palavras.
Mesmo depois que Tiba-san adoentou-se, continuei a freqüentar as sessões do Busshinji. Naquele tempo, esperávamos na rua, quando o monge abria o portão e nos deixava entrar. Não havia na parte de fora uma placa anunciando que lá era o templo. Nem sei direito se foi por minha vontade própria que cheguei ao templo. Ou outros colegas também não poderiam responder direito a esta pergunta. Certo dia indaguei um monge: "Não sei o que vim fazer aqui?". Sorrindo sua cara de lua cheia, o velho Ohata explicou "Não foi por sua vontade apenas, o Buda quis que você estivesse aqui". Nunca mais fiz pergunta semelhante.
Às vezes, descendo a São Joaquim ainda deserta e escura, tal pergunta me ocorre: o que vim fazer aqui?
ResponderExcluirPorém, ao sair do templo, com o dia já alto, o vozerio das pessoas na rua, os estudantes, o vendedor de frutas, as buzinas, não há mais perguntas.
É como se perguntássemos, porquê buscamos a Liberdade?
ResponderExcluirVery best site. Keep working. Will return in the near future.
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