De fato, as vestimentas ricas e coloridas, a aproximação com os poderosos e influentes nada podem acrescentar à minha prática. Ninguém é obrigado a acatar esta postura. Mas uma vez que adotei o budismo como luz de proa a fim de navegar o mar tenebroso de minha existência, a atitude mais exemplar tomada pelo Louvável foi justamente a renúncia. Sem renúncia, não se pratica o Dharma. Se muitas vezes as minhas palavras são fortes em relação à prática e aos praticantes, estas também são dirigidas a mim. Quando digo aos praticantes dedicarem-se mais tempo ao zazen, esta advertência serve igualmente a mim. No campo da experiência, o budismo é uma construção constante através da mente alerta. Claro, cometemos erros pois sem os erros não haveria a experiência.
Recentemente ganhei uma bicicleta de um praticante. Não ando de bicicleta a muito tempo, por isso necessitarei me exercitar nela. A prática do Dharma é como andar de bicicleta: se a atenção se for, consequentemente, haverá a queda. Mas terei que continuar a andar, correndo o perigo de cair novamente. Certa vez ouvi de um professor: "praticar o budismo é como andar de bicicleta". Muitas vezes nos cansamos e temos que descansar, mas depois retornamos ao exercício. No meu caso, não tenho mais como abandonar a bicicleta chamado Dharma.
Quando o praticante depara-se com a seriedade da prática, deve insistir em disciplinar-se e treinar sobretudo a mente. Treinar a mente durante o zazen e no cotidiano. Uma coisa não está desassociada da outra. E com a mente alerta, o corpo também deve estar de acordo. Uma coisa é a mente entender, outra o corpo acompanhar. Por isso, a prática do Dharma deve estar além da compreensão intelectual ou cognitivo. Assim, ao praticarmos às vezes cometemos erros por falta de atenção ou do corpo ainda inebriado pelo não entendimento. Quando explicamos algo a um praticante, ele responde "Tá!". Mas em seguida esquece-se. E se não esqueceu, não consegue realizar de maneira satisfatória a tarefa requisitada. Aquele "Tá" é tão ambíguo quanto "Não entendi nada". Seria mais honesto dizer "não entendi ainda". Ao cometer o erro, pelos motivos apontados, ele poderia pensar simplesmente: "todos cometem erros, por quê não eu". Ou ainda, errar é humano. Com esta saída irresponsável, não valoriza-se muito o erro cometido e continua errando como nada tivesse acontecido. Lastimável. Do ponto de vista do budismo, poderíamos dizer "acertar é humano". Haja visto que o treinamento consiste em tornar mais humano aquele que se encontra entorpecido pelo próprio egoísmo, com a mente condicionada, com o orgulho aflorado.
Quando me encontrava no mosteiro, no Japão, esta situação era constante. Os noviços eram convocados para tocar os sinos, os tambores, os sinais. Como novatos, acabavam cometendo erros. Acontecendo isso, provocava desarmonia no ambiente, pois algo foi cometido que alterava a ordem natural do Dharma. No caso, uma batida a mais no tambor ou alguma falha no toque do martelo no sino. Era quando o noviço fazia "sanja". Oferecia-se um inceso a Buda e a plenos pulmões dizia a todos: "Sanja Yoroshu". Quer dizer, "neste momento admito ter cometido uma desarmonia". Não se pode confundir com um pedido de desculpas, pois o equívoco já teria sido cometido de maneira não premeditada. Não é isso. Fazer sanja é um ato de humildade e respeito com a prática. É o respeito que mantemos com os nossos amigos de treinamento. É respeito com Buda e Patriarcas.
Errante. Que palavra interessante!
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