Houve uma época em que os inconformados buscavam abrigo em alguns refúgios. Época de contestação dos Anos de Chumbo - décadas de 60 e 70. No auge da Guerra do Vietnã, um monge nativo chegou a incendiar as próprias vestes para que o conflito terminasse, com a retirada das troças americanos de toda Indochina. Tempos em que os soviéticos invadiam a Checoslováquia e em Paris os estudantes tomavam as ruas. Em meio aos protestos, o existencialismo francês antagonizava-se entre Jean Paul Sartre e Albert Camus. Se alguns lutavam nas ruas, em meio à desilusão dos tempos modernos, outros entregavam-se às drogas. Falava-se em Paz e Amor. Tinham por tríade ideológia - ou anti-ideológica - drogas, sexo e rock'n roll. Mas também os inconformados descobriam o Zen Budismo através de D.T. Suzuki, de Jack Kerouac, Allan Watts e Tomas Merton. No Brasil, o velho casarão da rua São Joaquim era onde aconteciam as sessões de zazen. Sem falar uma única palavra de português, o Superior Shingu atraía dezenas de praticantes.
Este tempo se foi, mas o Zen continuou a fazer parte da vida dos inconformados. Talvez antigos leitores de Sartre, Camus, Ponty; agora leitores de Derrida, Deleuze e Foucault.
Da tribo "drogas, sexo e rock'n roll", estes também acabaram se transformando. A partir da revolução sexual nada se tornou proibido e não desperta mais o interesse dos antigos moralistas. São outros os moralistas da atualidade. Quanto ao rock, somente ficaram as lembranças: Alice Cooper se foi, Led Zeppelin está velho, Joe Cocker não sei que fim levou. Mas me lembro que Jimmy Hendrix e Janis Joplin morreram por overdose. A droga também caiu no desprestígio.
De todas estes comportamentos, o que mais incompatibiliza-se com o Zen é justamente a ingestão de drogas. Nada justifica do ponto de vista budista a sua ingestão. Está claro num dos preceitos: "não ingerir tóxicos". Não que o budismo preze os valores morais, combatendo o uso de drogas, mas porque a sua utilização vai contra o Caminho da Iluminação. Dos estados de consciência, a Iluminação é a consciência no mais alto nível. Em se tratando das drogas, parece que acontece justamente o inverso: alimenta a Ilusão. Tal atitude que nega o estado de consciência por meios artificiais, é a fuga da "realidade". Ainda que a "realidade" seja o Samsara para os budistas - um sonho - não pode ser negado simplesmente. A respeito, quando Buda se encontrava abaixo da árvore de Bodhi e o demônio Mara o admoestou, ele apontou com a palma a terra. Com os pés firmes no chão, o praticante deve avançar. Me parece que a droga afasta o homem das condições reais de existência, que é no mundo do Samsara. Se o Samsara se apresentar como fogo, ao ingerir droga o praticante é igual a madeira. Assim, deve se tornar fogo em meio ao fogo. Se o Samsara for água, ao ingerir droga o praticante é igual a fogo. Assim, deve se tornar água em meio a água. Mas se o Samsara for terra, o praticante pode ser madeira e assim crescer e desenvolver-se até as estrelas. Quanto à droga, nenhum sucesso pode ser realmente alcançado. Aqueles que necessitam dela, não possuem caráter para caminhar a passos largos com as próprias pernas. Ao contrário disso, o homem se torna um dependente, necessitando sempre de bengalas e muletas. Da saudade dos Anos Dourados guardo na memória as partidas de xadrez, a música eletrônica de Emerson Lake and Palmer, o teatro de Sartre e as primeiras leituras de Zen. Mas da droga, não me restou nem cinzas. Intoleravelmente contra as drogas tidas leves ou pesadas, pois ambos são droga. E quem necessita delas são igualmente drogas e necessitam de cuidados especiais.
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