segunda-feira, agosto 13, 2007

Criticando o Shushogi

12º. Alguns desafortunados e isentos de virtude são incapazes de ouvir a pronúncia dos Três Tesouros, mais ainda de tomar abrigo neles. Quando cometem erros, ficam temerosos e acabam buscando conforto nos espíritos que habitam as montanhas, nos fantasmas errantes e nos ensinamentos duvidosos. Desconhecem que agindo desta forma, não podem se livrar da rede dos sofrimentos. Se assim for, com urgência tomemos abrigo nos Três Tesouros, capaz não apenas de aliviar-nos do sofrimento mas principalmente possibilitar a realização da Iluminação.


Esta é a tradução comentada do parágrafo 12 de Shushogi. A respeito, tenho a dizer que Shushogi é uma compilação simplificada de partes de Shobogenzo. Teria sido divulgado para os leigos japoneses, usado atualmente nas cerimônias memoriais. Na minha tradução não se usa o termo santuários não budistas, referindo-se às manifestações de uma religiosidade primitiva conhecido por xintoísmo. Ao ser lido sem conhecer o contexto em que foi publicado, talvez pareça estranho a menção de práticas supersticiosas no Japão. Tais práticas estariam enraizadas na cultura autóctene. Não que se tenha que negar estas práticas. O que se coloca é justamente a natureza de uma religião que almeja a Iluminação. O budismo como o entendemos enfatiza a prática somada a uma disciplina, que possa conduzir à renúncia e assim diminuir os efeitos do sofrimento. Não estamos capacitados a referirmo-nos às outras tradições religiosas, sejam monoteístas e politeístas, nos quais não insere-se o budismo. Mas o budismo ensina a compaixão, não como mero estado emocional carregado de fé, mas como um ato de sabedoria. No caso, haveremos de conviver com as múltiplas manifestações culturais e religiosas, algumas delas fundamentalistas. Nesta situação, não por tolerância, muito mais por compaixão. Nem mesmo este ato torna os budistas melhores do que os outros. Achar que os budistas estão acima de qualquer outra religião, cultura, etnia, e por isso alimentar a vaidade da pureza de seus atos me parece irreal. Por outro lado, apegar-se à linguagem unicamente é desconsiderar a realização da prática concreta nos campos históricos da ambigüidade criados pela ilusão de Maya. É preferível praticar ao invés de patinar nos deslizes da própria ignorância. Nada substitui a prática. Nada substitui o zazen. Afinal, foi assim que fez o príncipe Sidharta!

Podemos falar de budismo, desde que se considere a prática. Sem ela, um budismo de leituras paralelas não torna o leitor praticante. Se temos que falar de budismo, podemos começar com as nossas ações realizadas: ajudou alguém? visitou algum asilo? alguma creche?; verificou que a sua raiva é produto de sua própria mente iludida?; que sua vaidade é uma droga?; que toda droga cria mais ilusão e sofrimento? Se estes atos não forem considerados, um budismo apenas de palavras é imoral.


Um comentário:

  1. Os shopping-centers, por exemplo, são santuários não budistas.

    ResponderExcluir