Shuhogi, como explicou Jisho Sensei, foi concebido, originalmente, para ser lido por praticantes leigos. Nele há uma condensação de idéias de Dogen Zenji expostas em Shobogenzo, obra de mais de 90 fascículos e que é de difícil leitura para o público em geral, não familiarizado com o pensamento de Dogen e com sua maneira de escrever. É dividido em 31 partes, sugerindo uma leitura diária e, principalmente, familiar. Pode, por exemplo, ser recitado nas cerimônias memoriais ou mesmo diante do altar familiar de nossos antepassados. Quando praticamos zazen, praticamos por eles, também.
Como todo texto, pode ser lido sob inúmeros vieses: teológico, literário, histórico, marxista etc. Pode ser cotejado com outros textos budistas ou mesmo comparado ao pensamento das diversas tradições.
Para o praticante, deve servir fundamentalmente de inspiração para a prática. O praticante sincero, que renunciou à compreensão limitada do intelecto e lançou-se nos domínios do não nascimento, não perde de vista o caráter aprisionador das palavras. Um exemplo pode ser dado a partir de Fukanzazengi.
Neste texto, apresentam-se as instruções para a prática de zazen. Um estudioso pode lê-lo por toda a sua vida. Há alguns pontos de difícil compreensão: o que significa, por exemplo, “pensar além do pensar e do não-pensar”? Quais a similaridades entre o Shikantaza ensinado por Dogen e o Vipassana? Então se recorre a outros textos, Zanmai-Ozanmai, Zazenshin e assim por diante. Pode-se bem passar uma vida nessa atividade. Ou pode-se praticar o zazen, sobre um cobertor enrolado, no quarto, virado para a parede, assim que as crianças dormirem.
Voltando ao Shushogi, o mesmo se aplica. Sua leitura deve ser tão fugaz como as gotas de orvalho na manhã, para usar um símile apreciado por Dogen. Assim que as palavras são lidas, elas já não mais existem, quem as leu igualmente, o papel também, assim como a tinta, os olhos e a mente. Livre, o praticante põe o livro de lado e senta-se no samadhi diante da parede.
Aquele que pratica o zazen buscando a iluminação, certamente fracassará. Assim como aquele que lê buscando a compreensão.
Em Fukanzazengi Dogen é enfático: não há diferenciação entre prática e iluminação. Este ponto é fundamental.
Qual é, então, o objetivo de ler esse texto? E qual é o objetivo de praticar zazen?
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